segunda-feira, 15 de abril de 2013

Quando o garçom ri atoa


O trabalho invisível

Todos nós saímos de vez em quando e vamos a um restaurante ou a um bar onde há música ao vivo. Sou um animal que observa e me causa estranheza observar trabalhadores da noite, quando se trata de remuneração, porque não são tratados com dignidade pelos seus patrões. Nos restaurantes e bares dedico especial atenção aos músicos e garçons, que, entre outras pessoas, trabalham na hora em que a maioria das pessoas está se divertindo.
Quando vem a conta da despesa do restaurante, lá estão os 10% do garçom e o “couvert” artístico do músico. Mas a pergunta que não quer calar é: como este dinheiro é repassado para os seus verdadeiros donos? Os garçons e as garçonetes que nos serviram com o seu sorriso e a sua atenção e os músicos que tocaram a canção que muitas vezes marca aquele momento para o resto de nossas vidas, e raras são as pessoas que percebem que eles existem.
Será que esses trabalhadores recebem todo o dinheiro que deixamos nesses estabelecimentos com a certeza de que vão chegar até eles? Como sou uma pessoa que observa, certa vez, ao receber a conta, em que constava o “couvert artístico” e os 10% do garçom, percebi que a desorganização era tanta, que este valor estava sendo cobrado até em cima do “couvert” dos músicos. Como se o “couvert artístico” fosse servido na bandeja pelos garçons e os músicos não existissem.
A partir daí comecei a perceber que aquele dinheiro era uma grana extra que entra para o caixa do restaurante, mas nem sempre é repartido de forma organizada com quem de direito. Em entrevista com músicos e garçons, percebe-se que muitas vezes pagam-se essas despesas agregadas à conta do bar ou restaurante e os merecedores do crédito recebem valores fixos por noite muito aquém do valor variável que entra pelo pagamento dos clientes.
Precisamos, portanto, estabelecer regras e fiscalizar se esses trabalhadores estão recebendo o que de fato merecem. Alguns sugerem até que esses valores sejam pagos diretamente aos músicos e garçons pelos próprios clientes. Mas existe sempre a dificuldade de não se ter o dinheiro em espécie para recompensá-los no momento do pagamento, pois a grande maioria dos pagamentos é feita com dinheiro de plástico. É preciso criar mecanismos legais e tecnológicos para que esses trabalhadores recebam remuneração sobre os clientes que de fato atenderam. O Ecad fiscaliza o que e quanto se toca, mas não fiscaliza o quanto se recebe para tocar, tudo isso é muito cômodo.
Nossos vereadores precisam estudar uma forma legal de fazer com que não exista aqui este tipo de injustiça, e que não se escute mais a boca pequena, porque, em nossa cidade, músicos e garçons não recebem proporcionalmente aos gastos de clientes em estabelecimentos comerciais, os quais não teriam vida se não fossem esses trabalhadores.
Olhando pelo ponto de vista moral, este é um desvio que pode ser corrigido e traria melhoria de vida substancial a essas pessoas que nos servem sem um contrato de trabalho. A dignidade no trabalho não é somente ser tratado com urbanidade, mas é receber uma remuneração digna pelo trabalho benfeito. A autoestima também passa pela boa recompensa do trabalho assalariado, que permitirá ao trabalhador dar aos seus entes queridos melhores condições de vida. Se é válido para cada um de nós, também é válido para todos os trabalhadores.
Numa época em que cada um pensa primeiramente em si, é premente que o legislador e o estado pensem no próximo, para que distorções sejam corrigidas e os recursos cheguem a quem de direito. É cultural e histórico em nosso país aqueles que trabalham não receberem a plena recompensa. Fica assim o nosso apelo para que um “mea culpa” seja feito e passemos a tratar estes trabalhadores que nos servem em muitas ocasiões com a distinção que merecem.
José Roberto Camacho
Professor do curso de Engenharia Elétrica da UFU
jrcamacho@ufu.br















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